AresAproximadamente 4 min de leitura

Em sua essência, a guerra é um fenômeno humano que remonta aos primórdios da civilização, e a sua personificação na mitologia grega, Ares, é um dos símbolos mais potentes e complexos já criados. Embora frequentemente associado à brutalidade e à violência desenfreada, o deus grego da guerra, Ares, carrega um simbolismo muito mais profundo e matizado do que se percebe à primeira vista. A sua figura não representa apenas o caos e a destruição, mas também a bravura, a coragem e a capacidade de enfrentar o perigo.
Ares é filho de Zeus e Hera, um fato que já carrega um peso simbólico considerável. Zeus, o senhor do Olimpo e do raio, e Hera, a deusa do casamento e do parto, são as forças primordiais do poder e da fertilidade. A união deles gerou uma figura que encarna o conflito, a discórdia e a força bruta, uma representação clara da dualidade presente na própria natureza humana.
Diferente de sua contraparte romana, Marte, que era reverenciado como uma divindade protetora e patrono dos agricultores, Ares era, em geral, temido e desdenhado pelos gregos. Ele era o deus da fúria e do derramamento de sangue, um guerreiro impetuoso que se deleitava com o som das batalhas. Essa perspectiva reflete a aversão dos gregos à guerra por si só, enxergando-a não como um fim, mas como uma tragédia necessária. Por isso, a ele se associavam as piores características da guerra: a loucura, o medo, a crueldade e o instinto cego.
Seus principais símbolos são o capacete de bronze, a lança e o escudo, que representam, respectivamente, a proteção contra o perigo, o ataque e a defesa. No entanto, é nos animais que se encontra uma rica tapeçaria de simbolismo.
No javali, um animal feroz e indomável, que personifica a brutalidade e a força incontrolável da guerra, sua figura evoca a ferocidade e o perigo iminente. No cão temos o simbolismo de lealdade e a agressividade, na mitologia os cães de guerra de Ares eram ferozes e incansáveis, representando a busca implacável pela vitória a qualquer custo. No abutre, animal necrófago temos um símbolo direto da morte e da destruição que seguem a batalha, sua presença sobre os campos de guerra é um lembrete sombrio das consequências da violência. E por fim a serpente, que na mitologia grega é um símbolo de renascimento, mas também de perigo, a serpente de Ares guardava a fonte de Thebes1, e seu veneno letal a conecta diretamente com a morte e a destruição.
O simbolismo de Ares transcendeu a mitologia grega e se manifesta em diversas outras culturas. Em algumas tradições, a figura de um deus da guerra é um reflexo das necessidades e valores da sociedade, por exemplo, em sociedades guerreiras, a divindade da guerra era mais reverenciada e vista como uma fonte de força e proteção. Em outras culturas, a guerra é vista como um mal necessário, e o deus da guerra é temido.
Ares também se manifesta em nossa própria psique. Ele representa a parte de nós que é capaz de lutar, de se defender e de enfrentar desafios. A energia de Ares é o impulso que nos leva a competir, a proteger aqueles que amamos e a lutar por aquilo em que acreditamos. É a força interior que nos permite superar obstáculos e perseverar diante da adversidade. O arquétipo de Ares nos lembra que a agressividade, quando canalizada, pode se transformar em um motor de coragem e autodeterminação.
O simbolismo de Ares é um convite para refletir sobre a natureza da guerra e do conflito, tanto em escala global quanto em nossa vida pessoal. Ele nos confronta com a brutalidade e a violência, mas também nos faz lembrar da importância de lutar por nossas convicções. Em última análise, a figura de Ares nos mostra que o conflito é uma parte intrínseca da experiência humana, e a nossa capacidade de lidar com ele de forma consciente é que define a nossa jornada.
1 – Thebes, ou Tebas, foi uma importante cidade na Grécia Antiga. Na mitologia, é conhecida como o local de nascimento de Hércules e o cenário de várias lendas trágicas, incluindo a história de Édipo. A serpente de Ares, citada no texto, guardava a fonte de Cadmo em Thebes, um evento fundamental na fundação mitológica da cidade.




